03 março 2009

Demografia e demagogia

O tópico da Segurança Social - e da sua insustentabilidade - tem sido um "cavalo de batalha" pessoal deste finais de 2006. Foi por essa altura que foi feita a última reforma do sistema, e foi também por essa altura que eu escrevi um artigo na revista Carteira sobre o mesmo. As conclusões eram, e continuam a ser, que o sistema é financeiramente insustentavel a prazo. Isso inclui as ultimas reformas feitas por Socrates.

O problema base é simples de entender. O sistema actual é "pay as you go", ou seja, eu jovem trabalhador pago a reforma da geração anterior, na esperança de que alguém pague a minha. É um puro sistema de transferência inter-geracional. E é preciso ter noção que, quando Bismark fundou o primeiro sistema de segurança social do mundo, em 1889 na Alemanha Imperial, o sistema era perfeito. Descontos até aos 65 anos, idade a partir da qual se poderia usufruir da reforma, com uma esperança média de vida a rondar os 45 anos. Nunca o chanceler alemão da "real politik" imaginou que no próximo século a esperança média de vida quase duplicasse e a idade da reforma não acompanhasse a evolução.

Agora... deixemo-nos de demagogias:

O secretário de Estado da Segurança Social, Pedro Marques, assegurou hoje que o sistema de pensões dos portugueses é «uma referência a nível europeu», uma vez que garante uma taxa de cobertura efectiva entre os 70 e os 80 por cento relativamente ao último salário recebido.

Quando eu leio barbaridades destas, confesso que me dá uma vontade enorme de desatar à estalada. O problema não é hoje! Actualmente a taxa de substituição média, i.e., qual a percentagem do último ordenado dado como pensão, ronda os 75 por cento. O problema é daqui a 20 anos!

O Fundo de Estabilização, ou seja, o pé de meia feito na segurança social para equilibrar as contas, vai começar a ser consumido em 2030 e, no limite, só dura até 2050. E isto tudo, tendo em conta que, hoje, o Estado já transfere uma quantia consideravel do Orçamento de Estado para a Segurança Social: algo entre 3 a 4 por cento do PIB.

A questão aqui é demográfica. Hoje, 1 em cada 10 portugueses tem mais de 65 anos. Daqui a 40 anos, em 2050, 2 em cada 10 portugueses terão entre 65 e 80 anos e 1 em cada 10 portugueses terá mais de 80 anos, a chamada quarta idade. Um terço dos portugueses, estará a consumir pensões. Se a isto juntarmos os 2 em cada 10 portugueses que estão abaixo do limiar da pobreza, e portanto ao abrigo da protecção do estado, poderemos estar a falar de perto de metade da população portuguesa a consumir a segurança social.

Pura e simplesmente não existem trabalhadores em número suficiente para financiar o sistema. Não se esqueçam que a relação não é um para um. Um trabalhador em média contribui com 250 euros, logo é preciso mais de dois trabalhadores para cada pensão média actual. E, à medida que o tempo passa, esse esforço vai aumentar e a pensão média vai diminuir.

Na altura, 2006, a minha pesquisa levou-me a escrever na peça:

"A taxa de substituição, ou seja, a quanto corresponde a pensão média paga face ao último ordenado do pensionista é hoje de 75 por cento. Daqui a 20 anos essa taxa descerá para os 50 por cento, podendo no limite chegar perto dos 45 por cento"

Depois veio a reforma do sistema e todos disseram "Aleluia! Está salvo!". Errado! Os problemas subjacentes continuam lá, simplesmente chutamos a bola 10 anos para a frente. E heis que vem a OCDE, esta semana, dizer:

Em 2030, as reformas em Portugal vão ser das mais baixas do conjunto dos 30 países mais desenvolvidos do mundo, desta forma, o pensionista luso deverá receber 54% do último salário que ganhou.

Vir dizer que está tudo bem pois hoje se paga 80 por cento do último ordenado como pensão é pura demagogia e da mais barata que existe em economia!

1 comentários:

Anónimo disse...

"Vir dizer que está tudo bem pois hoje se paga 80 por cento do último ordenado como pensão é pura demagogia e da mais barata que existe em economia!"

- Para quem apenas tem uma dimensão temporal do exercico do Poder por mais 5 anos, não é bem assim Guilherme :) Mas para o cidadão comum que trabalha e paga os seus impostos, estás pleno de razão.