27 fevereiro 2009

Como (não) gerir um banco

Hoje a Caixa Geral de Depósitos (CGD) revelou os seus resultados: uma quebra acima dos 50 por cento. E, obviamente, um dos tópicos do dia é o negócio que essa mesma caixa fez com o empresário Manuel Fino, em que a primeira aceitou acções sobreavaliadas da Cimpor, como garantia para amortizar a dívida.

A única desculpa para o negócio é manipulação política. É que, realmente, a memória em política é curta. Já nos esquecemos para que é que Manuel Fino pediu o capital emprestado para comprar as acções? Eu relembro: luta de poder no BCP.

Quando estava para ser decidido quem seria o próximo presidente do maior banco privado português - o BCP - um nucleo duro de investidores apoiou Santos Ferreira para esse cargo. So far so good… não fosse o facto de Santos Ferreira ser o antigo presidente da CGD, tendo-se demitido para exercer as funções de presidente do BCP. Na altura, os accionistas estavam em clima de “guerra aberta”, e foi a presença de um determinado “núcleo duro” que garantiu a posterior “unanimidade” [não confundir com unanimismo - isso é uma corrente literária!] da sua eleição.

E quem eram os membros desse núcleo duro? Joe Berardo, a família Moniz da Maia (Sogema), Manuel Fino, Pedro Teixeira Duarte e José Goes Ferreira, dois dos quais foram os proponentes do nome de Santos Ferreira. E quem foi o banco que os financiou? Advinharam: CGD, num valor total de 500 milhões de euros, só em 2007. 

Ver agora essa mesma CGD a fazer este negócio com Manuel Fino, não têm outra justificação senão “pagamento de favor”. Correu mal, em termos de garantia bancária e, há conta do contribuinte vem uma esmola.

E sim, é à conta do contribuinte! O accionista único é o Estado, e é o accionista único que leva com a responsabilidade de cobrir “actos de má gestão”. E quem paga as continhas ao Estado?

E que contas são estas? Muito simples: Manuel Fino entregou 64 milhões de acções da Cimpor. O preço de “compra” oferecido pela CGD foi 4,74 euros por acção, quando as acções transaccionavam a 3,79 euros. Alias, a média anual é de 3,66 euros por acção, no caso da Cimpor, mas estou a ser simpático.
Não é complicado fazer a conta: o Estado pagou 60,8 milhões de euros a mais pelas acções. "Guilherme, a CGD não pagou, aceitou-as como garantia", dirão alguns. Errado. É que, ao as aceitar como garantia para amortizar o empréstimo, aceitou que se amortizasse um empréstimo com activos acima do seu valor, ou seja, quem acaba com a conta ao fim do ano para pagar é a CGD.

Hoje, estão a cotar a 3,05 euros por acção. Tal quer dizer que, a preços de hoje, o Estado - ou melhor, o contribuinte - acabou de entregar a Manuel Fino uma mais valia financeira de 60,8 Milhões de euros, mais a perda de 47,36 Milhões de euros, desde que o negócio foi feito. É que, na ausência deste negócio, era o património de Manuel Fino a suportar esta perda. Mas, como as acções foram transferidas para o Balanço do banco do Estado, é este - logo, nós contribuintes - que suportamos esta perda. Temos o risco, com a contrapartida que Manuel Fino tem uma opção de compra sobre as acções: a CGD é obrigada a manter as acções na sua posse e, ao fim de 3 anos, Manuel Fino pode escolher recompra-las. 

Esta opção de compra implicita vale dinheiro. Isto porque, é um serviço que a CGD lhe está a fazer, ao lhe oferecer uma "cobertura de risco". Qualquer banco oferece este tipo de serviços a clientes institucionais, mas cobra por este serviço/risco. Assim de repente, contas redondas, esta opção de compra deve valer 0,10 centimos por acção, ou seja, 6,4 milhões de euros que o Fino devia ter pago pelo direito de poder recomprar as acções.

Contas finais, no dia de hoje, este negócio lesou a CGD em 114.5 Milhões de euros. Isto são quebras e lucros que, no limite, vão cair em cima do contribuinte, quando o Estado tiver de fazer (mais) um aumento de capital à CGD.

Continua-se a achar que faz sentido ter-mos um Banco Público?

0 comentários: